Pastoral Antialcoólica: 25 anos auxiliando quem precisa de ajuda
05.11.2019
“A minha última conta de bar foi 860 reais”. “Eu chegava em casa depois do trabalho e ia direto para o bar”. Eu achava que isso não estava prejudicando a minha vida ou a minha família”. “Hoje eu vejo o quanto meus filhos e minha esposa sofreram com aquilo”. A pior coisa que o álcool fez comigo foi me levar para cocaína”. “Foi ali que eu percebi que eu não tinha mais jeitos, que eu estava acabado”. Essas poderiam ser frases de um filme dramático, mas refletem a realidade de muita gente que passou pela Pastoral Antialcoólica que no dia 8 de novembro comemora 25 anos de existência na Diocese de Joinville. Para comemorar o aniversário, na sexta-feira (8), às 20h, o bispo Dom Francisco Carlos Bach preside uma Missa na paróquia São João Batista, do bairro Fátima.
Confira toda a programação de comemoração dos 25 anos da Pastoral Antialcoólica
Atualmente são 21 equipes, incluindo um grupo itinerante que faz palestras e formações em empresas independentemente do horário em que são chamados para testemunhar e oferecer apoio. O alcoolismo é um problema mundial e que aqui no Brasil atinge a população de todas as faixas etárias e sociais. Uma pesquisa do Ministério da Saúde apontou que 17,9% da população adulta no Brasil faz uso abusivo de bebida alcoólica. O percentual é 14,7% a mais do que o registrado no país em 2006 (15,6%).
É considerado uso abusivo de álcool, a ingestão de quatro ou mais doses entre as mulheres e cinco ou mais doses de bebidas alcoólicas entre os homens, em uma mesma ocasião, nos últimos 30 dias. O Ministério da Saúde alerta que o consumo de qualquer tipo de bebida alcoólica pode trazer danos imediatos à saúde ou a médio e longo prazo. A médica Mariana Cristovão Garcia que é residente de psiquiatria conta que o álcool interage com o sistema nervoso causando relaxamento e diminuição da ansiedade, sintomas similares ao que acontecem quando a pessoa toma alguns medicamentos tarja preta. “Além disso, quando a pessoa ingere o álcool é como se ela ativasse a região das recompensas no cérebro. É como se você fizesse alguma coisa muito boa e o seu cérebro entendesse que tem que liberar substâncias de prazer”, explica a profissional. E é por isso que a bebida alcoólica causa dependência.
Marielson Marciniak médico residente em psiquiatria fala sobre o tratamento de uma pessoa que tem problemas com álcool e outras drogas. “É importante saber que as recaídas podem acontecer durante este processo e que isso não deve ser motivo de julgamento por quem está próximo. Falando nisso, a família e quem convive com essa pessoa também precisa receber apoio e estar disposto a ajudar. Todos esses são fatores que contribuem para o sucesso no tratamento. O importante é o paciente não desistir. O objetivo é reduzir gradativamente os danos que podem ser causados por causa do alcoolismo”, relata o profissional.
História da Pastoral Antialcoólica na Diocese de Joinville
Na década de 90, voluntários que trabalhavam com a Pastoral Social da paróquia São João Batista perceberam que muitas famílias que eram ajudadas tinham problemas com álcool. A partir de então esses líderes conheceram o trabalho que era desenvolvido pela Associação Antialcoólica que tinha sede em São Paulo e havia implantado um núcleo de apoio na paróquia Imaculada Conceição, do bairro Boa Vista, em Joinville.
No dia 8 de novembro aconteceu a primeira reunião de apoio na paróquia São João Batista. Na oportunidade, 36 pessoas se reuniram. “A gente já conhecia a realidade das famílias e assim fomos convidando quem precisava de ajuda para que conhecessem aquele trabalho que estava iniciando”, relembra Luiz Carlos Sales que foi um dos fundadores da pastoral e atua como voluntário até hoje.
Depois disso, durante uma Assembleia Diocesana Pastoral foi aprovada a criação da Pastoral Antialcoólica. Desde então, milhares de pessoas foram atendidas. Atualmente, a estimativa é que cerca de 600 participem dos encontros que acontecem semanalmente em paróquias e comunidade de Joinville e outras cidades da diocese.
Durante essas reuniões, a acolhida é um dos principais momentos. É nesta hora que quem está participando pela primeira vez se sente parte do grupo. Na sequência tem os depoimentos de quem superou o vício, a leitura e reflexão do Evangelho do dia e o momento em que as pessoas são convidadas a ingressar na pastoral. É o momento chamado de “aceite”. “É importante a gente deixar claro que nem sempre a pessoas precisa ser dependente para participar das reuniões e aceitar ser um membro. Aliás, em muitos casos é um familiar que procura ajuda primeiro, geralmente a mãe ou a esposa”, conta o coordenador diocesano da Pastoral Antialcoólica, Jaime José Ulbrich.
Com o passar dos anos os grupos foram se instalando em outros endereços e os líderes também perceberam a necessidade de ter uma sede própria. Em 2001, a prefeitura de Joinville fez uma sessão de uso para que a Pastoral Antialcoólica pudesse usar uma área com mais de 6 mil metros quadrados, no bairro João Costa. O espaço é usado para retiros, encontros e formações de lideranças.
A constatação empírica de quem está à frente dos grupos de apoio de que tem aumentando o número de mulheres que buscam ajuda é confirmada pela pesquisa feita pelo Ministério da Saúde. Em 2006 a quantidade de mulheres que faziam uso abusivo de álcool era de 7,7%. Hoje esse número é de 11%. Crescimento superior ao dos homens que ficavam em 24,8% e hoje estão em 26%. Desde 1967 a Organização Mundial da Saúde considera que o alcoolismo é uma doença.
Relatos de superação
Quem encontra Carlos Dallagno, de 48 anos, na sede da Pastoral Antialcoólica, ou como catequista não sabe a força que precisou ter para deixar o vício como uma página triste da sua história. “A pior coisa que o álcool fez para mim foi me levar para a cocaína. Eu bebia e sabia que alguns amigos usavam essa droga. Na época eu já tinha três filhos, hoje tenho quatro. Um sábado, fui no bar pela manhã, almocei e dali saí com esses amigos em busca da droga. Na verdade, eu sou de uma família cristã e sempre tive medo de usar essas coisas, mas aquele dia eu estava embalado pela bebida e acabei experimentando. Dali em diante o sofrimento só piorou para a minha família. Eu chegava a negar iogurte para os meus filhos. Dizia que a minha esposa tinha que explicar para eles que eu não era banco. Mas fazia isso só para sobrar mais dinheiro para gastar com a bebida e a droga”, conta Carlos.
Diante da situação do filho, a mãe de Carlos e o filho mais velho dele procuraram apoio na pastoral. “Um dia a minha mãe me convidou para ir em uma reunião entregar uma medalha para ela. Quando eu soube o que era, achei um absurdo e ainda estar levando o meu filho junto. Tomei três cervejas e fui. O meu sentimento era como se eu estivesse fazendo um favor para ela. Na verdade, era ao contrário. Ali foi a salvação da minha vida. Eu não acreditava que aquelas pessoas poderiam estar feliz por eu estar ali e que não iriam me cobrar nada para me ajudar. Na primeira reunião percebi que tinha mais gente sofrendo como eu. No segundo encontro aceitei ingressar na pastoral e agora estou prestes a completar 18 anos de sobriedade”, comemora.
Gilmar de Castro é outro que contou com o apoio da Pastoral Antialcoólica para superar o vício. “Se eu pudesse dar um conselho para os pais, eu diria para que tomassem cuidado com a bebida dentro de casa. Quando eu fui para o bar, eu já era um alcoólatra. Com dez anos de idade eu fazia porre de caipirinha com o meu pai. O homem conta que passou a adolescência e juventude enfrentando o problema. Depois que casou e quando os filhos nasceram imaginava que poderia largar o vício, mas não conseguiu. “Meus filhos tiveram que ajudar a minha mulher a me carregar para dentro de casa várias vezes. Na época eu morava em um sítio no Paraná. Meu irmão viajou de ônibus de Joinville até lá por mais ou menos 12 horas para me resgatar. Vim embora para Joinville, e falei que só um milagre muito grande para me recuperar. E o meu irmão me levou no grupo da paróquia Bom Jesus, do Aventureiro. Na primeira reunião fiz o ingresso e estou 15 anos sem beber nada com álcool. Meu sítio continua lá e eu não posso ir porque tenho medo de uma recaída. É aqui na sala da pastoral que eu estou entre amigos, entre pessoas do bem e que me ajudaram. Tenho dois netos e eu quero ter o prazer na minha vida deles nunca me verem bêbado”.
A história de Antônio Vilmar Pereira é parecida com a de tantos outros que sofreram com o vício. Ele conta que não viu os filhos crescerem. “Meus filhos foram criados pela minha esposa. Eu só tomava cerveja, mas isso foi suficiente para me fazer muito mal. Me tornei um pai e um marido ausente. Lembro bem que em uma terça-feira eu saí do trabalho e fui em um restaurante. Mesmo eles falando que não serviam bebida, eu insisti. Tomei várias garrafas e quando me dei conta estavam todos os funcionários me olhando. Peguei o carro e quase cometi uma tragédia. Tempos depois ingressei na pastoral. Quando eu já estava pouco mais de um mês sóbrio, foi aniversário da minha filha. Peguei no bração dela ela para colocar sentada no meu colo, e ela começou a chorar. Me preocupei e perguntei o que eu tinha feito de mal, se tinha machucado. Foi aí que ela disse que sabia que um dia eu iria pegar ela no colo como um pai faz com um filho. Nesse momento meu rapaz chegou perto e foi ali que eu vi que tinha uma filha moça e um filho barbado dentro de casa. O álcool não tinha deixado eu ver o quanto eles tinham crescido”.
Há 12 anos Márcio Rosa conheceu a Pastoral Antialcoólica. Após a separação, ele morava com a irmã e foi até o grupo motivado por ela. “Eu pagava primeiro a minha conta no bar. Falava que ia ali e já voltava, e ficava horas na rua. Eu frequento a pastoral na paróquia Nossa Senhora de Fátima, no Ituam. E graças a esse trabalho hoje tenho a minha família restaurada. Louvo a Deus por isso e agradeço aos amigos que abrem os ouvidos e coração nesses encontros. Pessoas como eu precisam dessas salas da Pastoral Antialcoólica”.
Quem precisa de apoio ou conhece alguém que tenha problemas com álcool e drogas pode procurar uma das salas da Pastoral Antialcoólica ou então entrar em contato com os responsáveis pelo telefone (47) 3463-8598.
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